Value at Risk (VaR), Backtesting e ES (Expected Shortfall) e mais!

Bruno Haas

Entre as diversas ferramentas utilizadas na gestão de riscos no mercado financeiro, o Value at Risk (VaR) se destaca como uma métrica fundamental para estimar potenciais perdas em condições normais de mercado. No entanto, tão importante quanto calcular o VaR é avaliar sua eficácia — e é aí que entra o backtesting, um verdadeiro teste de realidade para os modelos de risco. Saber até onde um fundo pode suportar perdas e garantir que as métricas utilizadas para estimar esses riscos sejam realmente eficazes é fundamental para a proteção do patrimônio dos investidores e a confiança do mercado.

Neste artigo, iremos falar sobre:

  • O que é Value at Risk (VaR) e por que ele é amplamente utilizado;
  • A importância do Backtesting como teste de eficácia dos modelos de risco;
  • Como o fator de escala determinado pelas regras de Basileia impacta diretamente a avaliação de risco e a exigência de capital;
  • Como utilizar a métrica de ES (Expected Shortfall)

O que é VaR?

O Value at Risk (VaR) é uma das ferramentas mais utilizadas globalmente para medir o risco de mercado de um portfólio de investimentos. Trata-se de uma métrica estatística que responde à seguinte pergunta:

“Qual é a perda máxima esperada em determinado período, com um certo nível de confiança, em condições normais de mercado?”

Em outras palavras, o VaR estima o quanto um fundo pode perder em um intervalo de tempo específico, considerando um determinado grau de certeza. Por isso, ele é amplamente utilizado por gestores de fundos, administradores fiduciários, instituições financeiras e reguladores.

Exemplo prático:

Imagine que o VaR de um fundo seja R$ 500 mil ao nível de confiança de 99% em 1 dia. Isso significa que:

  • Existe 99% de chance de que o fundo não perca mais de R$ 500 mil em um único dia.
  • E existe 1% de chance de que a perda ultrapasse R$ 500 mil — essa é a chamada exceção ao VaR

Níveis de Confiança: 95% ou 99%?

Quanto maior o nível de confiança, maior o valor do VaR, pois ele incorpora mais proteção contra eventos raros. Os níveis de confiança mais comuns no mercado são:

Nível de ConfiançaInterpretaçãoAplicação
95%Em 95% dos dias, a perda não será maior que o VaR. Há 5% de chance de exceção.Mais sensível, usado em análises táticas, day-to-day e controle interno.
99%Em 99% dos dias, a perda não será maior que o VaR. Apenas 1% de chance de exceção.Mais conservador, usado em exigências regulatórias e backtesting Basileia.

Existem diferentes métodos para calcular o VaR:

Métodos de Cálculo do Value at Risk (VaR)

VaR Paramétrico (Delta-Normal)Assume que os retornos seguem uma distribuição normal. Utiliza média e desvio padrão para estimar a perda.
VaR HistóricoUtiliza os retornos históricos reais do portfólio para estimar a perda máxima esperada.
VaR por Simulação de Monte CarloSimula milhares de cenários de mercado com base em modelos estatísticos complexos.

O papel do Backtesting

O backtesting é o processo de comparar as perdas reais com as perdas estimadas pelo VaR, verificando quantas vezes as perdas ultrapassam o valor estimado (chamadas de exceções). Esse processo é crucial para validar a eficácia do modelo de risco. Em outras palavras:

“Quantas vezes o fundo perdeu mais do que o VaR estimado?”

Essas ocorrências são chamadas de exceções ao VaR. O objetivo do backtesting é verificar se a quantidade de exceções está dentro do intervalo estatisticamente esperado.

Exemplo

Se você calcula o VaR com 99% de confiança, isso significa que em 1% dos dias é esperado que a perda ultrapasse o valor do VaR. Em 250 dias úteis (aproximadamente 1 ano), espera-se até 2 a 3 exceções. Se o número de exceções for muito maior que isso, o modelo está subestimando o risco, e precisa ser revisado.

O Que Diz a Regulação de Basileia?

A Basileia I, II e III, frameworks internacionais para regulação do mercado financeiro, trata como necessário que as instituições financeiras realizem backtesting diário do VaR, especialmente ao nível de confiança de 99%.

Por exemplo, em um modelo com confiança de 99%, espera-se aproximadamente 2 a 3 exceções ao longo de 250 dias úteis. Se o número de exceções for significativamente maior, é um sinal de que o modelo está subestimando o risco.

O fator de escala e as zonas de backtesting (Basel)

O Comitê de Basileia para Supervisão Bancária estabeleceu diretrizes rigorosas para backtesting, dividindo os resultados em zonas com base no número de exceções:

ExceçõesZonaInterpretaçãoFator de Escala
0 a 4VerdeModelo válido e estável3.0
5AmarelaRisco subestimado, revisão recomendada3.4
6AmarelaModelo deve ser ajustado3.5
7AmarelaFalha significativa na estimação de risco3.65
8AmarelaExposição ao risco mal representada3.75
9AmarelaLimite de tolerância do modelo3.85
≥10VermelhaModelo inválido — requer substituição imediata4.0

Esse fator de escala atua como um multiplicador sobre o capital regulatório requerido, penalizando modelos ineficientes. Ou seja, quanto mais exceções, maior a exigência de capital, o que pode impactar diretamente a alavancagem e o retorno dos fundos.

Exemplo

Imagine um fundo que apresentou 7 exceções no ano no seu modelo de VaR 99%. Ele entra na zona amarela, com fator de escala 3.65, ou seja:

Se antes a exigência de capital para risco de mercado era, por exemplo, R$ 1,5 milhão (500 mil * 3.0), agora será R$ 1,825 milhão (500 mil * 3.65)

Mesmo que o gestor de fundos não esteja sujeito diretamente às exigências de Basileia, o fator de escala é um importante indicador da robustez dos modelos de risco utilizados. Um modelo que constantemente entra na zona amarela ou vermelha compromete a confiança na análise de risco e pode levar a decisões equivocadas.

Além disso, instituições mais robustas, como bancos custodiante e administradores fiduciários, observam essas métricas como parte das boas práticas de governança e compliance.

Evolução do VaR e Expected Shortfall (ES)

Com o avanço das regulamentações globais, o VaR — Value at Risk vem sendo complementado pelo Expected Shortfall (ES), de acordo com as recomendações do Fundamental Review of the Trading Book (FRTB) do Comitê de Basileia.

Por quê essa mudança?

O Expected Shortfall é considerado mais sensível a eventos extremos (tail risk), pois calcula a média das perdas nos piores cenários que superam o VaR. Ou seja, enquanto o VaR nos diz qual é o limite esperado de perda com um determinado nível de confiança, o ES mostra quanto se espera perder quando esse limite for ultrapassado. Em termos simples:

Se o VaR informa “quanto posso perder com 99% de confiança?”, o ES responde “se eu perder mais do que esse valor, quanto devo esperar perder em média?

O ES oferece uma visão mais completa e conservadora do risco, capturando o comportamento da cauda da distribuição, onde estão os eventos extremos e menos prováveis, mas que podem ter alto impacto no portfólio. Por isso, o ES se tornou recomendação oficial do Comitê de Basileia, complementando o VaR como métrica de risco de mercado

Como a Fundsys ajuda nesse processo

O módulo de Indicadores de Risco da Fundsys oferece:

  • Cálculo automático de VaR nos métodos Paramétrico, Histórico e Monte Carlo;
  • Cálculo de ES (Expected Shortfall);
  • Backtesting contínuo com monitoramento das exceções diárias;
  • Classificação automática da zona Basel com atribuição do fator de escala;
  • Visualização clara do impacto potencial no capital requerido;
  • Geração de relatórios prontos para auditoria e comitês de risco.

Tudo isso em uma interface amigável e centralizada, integrada com dados de mercado em tempo real.

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